- Me parece instigante o título de sua primeira obra. Como vai dar conta do recado?

- Parece-me impossível ser um bom escritor apenas seguindo os seus instintos. O conhecimento do vocabulário do idioma no qual você narra, a busca por informações através de leitura extensa e de pesquisas, o olhar e o cérebro atentos para os estilos existentes dos renomados literatos de seu País, e por fim a sua fonte de inspiração, tudo isso faz com que você possa traçar um objetivo claro ao delinear os personagens principais da sua trama.

- Sinto que algo está movimentando a sua maneira de ver e de buscar a sua expressão através da escrita. Cite-me alguns casos ou melhor, algumas obras que, segundo você, poderiam levá-lo a uma maior reflexão e cuidado com a narrativa do romance que pretende desenvolver.

- São muitos aqueles que no presente momento me influenciam. Obviamente que isso ocorre através de leitura constante e do grande prazer de admirar a capacidade que esses autores têm para reter a sua atenção.

- Você sofreu grande influência francesa em sua educação e no seu modo de viver. Certamente citará os grandes nomes consagrados como Balzac, Zola, Camus, entre outros, não é isso?

- É isso também. Porém atualmente busco minha inspiração junto aos brasileiros, clássicos renomados, que entenderam o que era naquele momento, em um contexto especial de época, a alma brasileira.

- Por exemplo?

- Segue o exemplo, porém leia com atenção e veja o quão genial é o romance O Cortiço de Aluísio Azevedo. Busque enxergar através de sua imaginação e leitura como é, ou melhor, como seria a Rita Baiana. Vamos lá:

"E Jerônimo via e escutava, sentindo ir-se-lhe toda a alma pelos olhos enamorados. Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu chegando aqui: ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se não torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era o açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com o seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas que zumbiam em torno da Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca. (...) Mas Jerônimo nada mais sentia, nem ouvia, do que aquela música embalsamada de baunilha, que lhe entontecera a alma; e compreendeu perfeitamente que dentro dele aqueles cabelos crespos, brilhantes e cheirosos, da mulata, principiavam a formar um ninho de cobras negras e venenosas, que lhe iam devorar o coração."

- Que maravilha!!! Entretanto, relate-me qual é a linha mestra do seu conto ou de seu romance.

- Hoje não! Desejo aguçar a sua curiosidade e a dos leitores do Correio do Sul. Aguarde-me até a próxima semana.

- Xiiiii!!! Ver para crer.

- Não senhor, meu amigo. Ler para entender.