2020, “o pior ano que já existiu”, assim classifica a revista norte-americana Time em edição que chega às bancas em 14 de dezembro. A publicação faz uma retrospectiva do ano que foi marcado pela pandemia de covid-19, pelo assassinato de George Floyd, pela eleição norte-americana e por desastres ambientais.
Sim, 2020 é um ano horrível. Mais para uns do que para outros. No Brasil (...). A crise sanitária aprofundou o racismo no mercado de trabalho, pelo menos é o que aponta estudo do Dieese: Entre o 4º trimestre de 2019 e o 2º de 2020, cerca de 7,4 milhões de homens e mulheres negras ficaram desocupados, contra 2,7 milhões de brancos. A alma não tem cor, mas o desemprego tem.
Para desgosto deste que vos escreve, o mercado potencializa o discurso meritocrático a ponto de criar aberrações como o coaching. “Tenha fé em si mesmo”, “não deixe dias cinzentos tirarem o brilho da sua força”, “aprenda a dizer sim para os desafios” e por aí vai. O problema é que essa patacoada joga para os sujeitos a responsabilidade de coisas que não estão exclusivamente sobre suas tutelas, ainda menos quando esses sujeitos são negros e negras, pois existem outros tipos de circunstâncias que estão fora dessa lógica. Então, contra o discurso meritocrático, vamos a um exercício reflexivo de prevenção ao equívoco de quem incorre no erro de querer dar lição de meritocracia a pessoas pretas.
É mérito seu não ser perseguido quando entra em um supermercado ou loja?
É mérito seu não morrer espancado gratuitamente?
É mérito seu nunca ter perdido uma vaga de emprego pela cor da sua pele?
É mérito seu não ser vítima de piadinha do tipo é “coisa de preto”?
É mérito seu não te confundirem com funcionário quando você está fazendo um passeio no shopping?
É mérito seu que a sua patroa nunca tenha deixado seu filho cair do décimo quarto andar?
É mérito seu você nunca ter ouvido “esse menino vai dar um sequeiro dos bão?
É mérito seu não ser confundido com bandido?
É mérito seu que nunca desconfiem da sua palavra?
É mérito seu nunca ter sido humilhado e inferiorizado em seu trabalho pela cor da sua pele?
É mérito seu nunca ter o seu trabalho rejeitado por ser negro ou negra? Mesmo que o negro ou a negra em questão seja médico(a), juiz(a), padre?
É mérito seu nunca ter sido ameaçado de morte pela cor da sua pele?
É mérito seu não ser retirado de algum lugar por ser negro?
É mérito seu?